quinta-feira, 17 de junho de 2010

ENTREVISTA

Paula Kalantã
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Por: Fabio da Silva barbosa

Em todo o Brasil, comunidades indígenas passam por inúmeras dificuldades. Na entrevista deste mês, estaremos conversando com Paula Kalantã, Tupinambá da Bahia, sobre todo esse conflito.
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Independente da etnia, todos as comunidades indígenas, vêm passando, desde a tomada de seu território pelos europeus, por um processo de perda total de direitos. Por que isso continua acontecendo há tanto tempo e a sociedade, de uma maneira geral, sempre finge que nada está havendo?
Em minha opinião, a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) não cumpre seu papel político de garantir o cumprimento da lei que assegura aos índios o direito ao seu território. A prova é que a falta de demarcações e a invasão de territórios indígenas são os principais problemas enfrentados.

Ainda hoje existe a visão de que índio só vive na aldeia. Como você vê isso?
A sociedade tem a visão de que ser indígena significa andar nu, enfeitar-se com plumas e pinturas corporais, ter alma pura e ingênua... O fato de não mais andarmos nus ou adornados com penas não nos torna menos indígenas, como qualquer outra sociedade, nós, povos indígenas, passamos por transformações resultantes de contatos (impostos ou não) com sociedades diferentes e, portanto, culturas diferentes.

Na Bahia os Tupinambás estão passando por uma série de problemas. Fale sobre.
Sem uma solução da União e da Funai, os indígenas, dentre eles os Tupinambás, sofrem com a demora na demarcação de suas terras, que ficam num espaço que envolve os municípios de Una, Buerarema, e Ilhéus (Oli-vença), que propôs, no final do ano retrasado, uma ação pública contra a União e a Funai.
Na época, o Ministério Público federal (MPF) deu prazo de um ano para a delimitação da terra, com futura desapropriação, e com a apresentação, em juízo, de relatórios trimestrais acerca do andamento do trabalho de demarcação. Enquanto a demarcação não acontece, indígenas e fazendeiros vivem em constante tensão. O resultado pode ser visto nas aldeias indígenas, sobrevivendo de forma precária, com problemas de saúde e sem área para cultivo. Além das ações possessórias impetradas por fazendeiros e acatadas pela justiça, que dão ganho de causa, tendo em
vista que a terra ainda não está demarcada.

Por que o cacique Babau está isolado desde sua prisão?
O cacique Babau lidera a luta do povo Tupinambá pela definição dos limites da aldeia e sofre com a criminalização. Ele responde a processos como “criminoso” por defender o direito do seu território. Para eles, isso se torna uma grande dor de cabeça, sendo Babau uma referência pra outros povos que queiram reivindicar suas terras.

E a comparação entre Babau e Lampião?
Com certeza não se justifica. A invasão e a expulsão violenta dos indígenas de seus territórios foi e ainda é prática corriqueira por aqui, e muitos desses invasores históricos hoje posam como vítimas, combatendo ativamente a demarcação das terras indígenas. Não sei quanto a vida e revolta de Lampião mas acho que ninguém vai permitir que um estranho arme uma rede bem no meio de sua sala e achar a coisa mais natural do mundo. Vai?

De onde vem os argumentos contra o cacique?
Essas pessoas, como já falei, são os grandes fazendeiros e empresários invasores de terras. Antes de todos eles chegarem aqui, nós já existíamos, e tínhamos nossas terras; não pegamos nada de ninguém, ao contrário, eles foram se instalando com falsos documentos e se passando por donos devido a política malvada que doou as nossas terras a eles. Falam que aqui é fácil dizer que é indígena. Isso é a mesma coisa que dizer que eles nasceram aqui. É claro e evidente que eles vão sempre dizer isso.

Tem algum movimento ou organização dando apoiando aos Tupinambás?
Sim, vários. Anaí, Cimi, movimentos estudantis, e alguns políticos do PT que estão discutindo a situação. Se bem que só acredito na gente brigando por nosso povo, o que não vai acontecer a exemplo do que está acontecendo com Babau.

O que poderia reverter toda essa situação?
Demarcação de nossas terras, educação diferenciada dentro das aldeias, pois é um fortalecimento de nosso povo, melhorar a saúde, nossos remédios serem permitidos... Não ao desmatamento.
Desejo que o mundo nos respeite e acabe com a discriminação e o preconceito. Desejo que nosso povo possa viver livre, mantendo sempre a energia positiva dentro da nossa crença e cultura.

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