sexta-feira, 26 de março de 2010

POESIA PARA QUEM PRECISA

Por: Helena Ortiz
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Caros amigos,
Em sintonia com os objetivos do editor, eis que se abre hoje uma janela, uma oportunidade para novos poetas, prosadores, cantadores da vida, pesquisadores da alma.
Sabemos que o poeta existe, está por aí, no meio de vocês, pode ser um de vocês, atravessando a rua, andando no mesmo ônibus, com medo da mesma polícia, fazendo frente a todas as dificuldades que a espécie enfrenta diariamente.
Por que não se mostra?
Por que a poesia é, principalmente para o jovem, uma coisa difícil de perceber. Primeiro, ele pensa que há alguma coisa errada com ele, alguma coisa que o diferencia dos demais. Não lhe chama a atenção tanto as brincadeiras, os divertimentos, as seduções com que lhe acenam amigos e vizinhos. Precisa estar sozinho, muitas vezes. Precisa rabiscar (ainda que não mostre) alguma coisa do que sente. O que será? Como definir o que sente? Como expressar exatamente o sentimento, a idéia? Como se faz um poema? O que é um poema? E o que é essa angústia (será angústia?) essa sede que não é de água?
Não adianta resistir e pensar: isso não é importante, é inútil, não vai me levar a nada. Tenho que terminar o meu curso e dar um jeito na vida. Tenho que pagar as contas.
Sim, amigo poeta, certamente tem. Todos temos. Mas o que se passa em você, que é diferente, é que você não deve fugir ao chamado da poesia. Não deve achar que é inútil, porque é dali que sairá a grande alegria e o grande tormento da sua vida. Dela não se foge. Ela, sim, pode fugir de você, se não a olhar, se não a acalentar e pensar nela todos os dias, procurando traduzir seu sentimento, expressando seu amor ou sua ira, exaltação ou dúvida.
Esta é a primeira coluna, portanto não temos ainda nenhuma revelação de quem queira penetrar no universo da poesia. Para começar, por isso, destino o espaço ao grande poeta brasileiro, nascido em União dos Palmares, nas Alagoas, mas por mero acaso. Onde ele mora mesmo é dentro de quem o conhece. Vivo, enorme, imortal, mesmo passados 107 anos. Seu nome é Jorge de Lima e o poema é:
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Poema
do nadador
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A água é falsa, a água é boa.
Nada, nadador!
A água é mansa, a água é doida,
aqui é fria, ali é morna,
a água é fêmea.
Nada, nadador!
A água sobe, a água desce,
a água é mansa, a água é doida.
Nada, nadador!
A água te lambe, a água te abraça
a água te leva, a água te mata.
Nada, nadador!
Senão, que restará de ti, nadador?
Nada, nadador.
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Jorge de Lima
Do livro:
"Poemas - Jorge de Lima"
[selecão de Gilberto Mendonca Teles]
Global Editora e Distr. Ltda
1994, SP
Enviado por:
Fernando Tanajura Menezes

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